Medida de Trump para acabar com subsídios para carros elétricos enfrenta resistência e dúvidas

22/01/2025 – Se o presidente Donald Trump conseguir o que quer, a transição da indústria automotiva para veículos elétricos logo será revertida. Ele eliminará créditos fiscais para compras de carros elétricos, subsídios federais para carregadores e subsídios e empréstimos para ajudar a reformular linhas de montagem e construir fábricas de baterias.

As ordens executivas emitidas por Trump nesta segunda (20) representam uma rejeição abrangente de um dos pilares do programa multibilionário do ex-presidente Joe Biden para enfrentar as mudanças climáticas, que os republicanos retratam como uma campanha para banir carros a gasolina.

As ordens também representam um desafio para os fabricantes de automóveis que investiram bilhões de dólares em veículos elétricos, em parte porque o governo Biden os encorajou a fazê-lo. Mas algumas das ordens parecem contornar o Congresso ou os procedimentos de regulamentação federal, o que pode torná-las vulneráveis a ações judiciais e até mesmo resistência dentro do Partido Republicano.

Embora apresentadas como uma forma de revitalizar a indústria automotiva dos EUA, as ordens podem fazer com que os fabricantes de automóveis dos EUA fiquem para trás se reduzirem seus programas de veículos elétricos enquanto fabricantes asiáticos e europeus continuam aperfeiçoando a tecnologia, dizem analistas.

Hoje 50% das vendas de carros na China são elétricos ou híbridos plug-in, e fabricantes chineses como a BYD estão vendendo mais carros ao redor do mundo, tirando clientes de empresas de automóveis estabelecidas, incluindo fabricantes dos EUA.

Uma ordem executiva intitulada “Liberando a Energia Americana” e assinada pelo presidente na segunda-feira instrui as agências federais a pausarem imediatamente a distribuição de fundos alocados pelo Congresso que faziam parte do esforço de Biden para impulsionar a indústria automotiva em direção a veículos sem emissões.

Entre outras coisas, os fundos ajudaram estados a instalar carregadores rápidos ao longo de rodovias principais e forneceram créditos fiscais de até US$ 7.500 para compradores de carros elétricos novos e US$ 4.000 para compradores de modelos usados.

Os créditos tornaram o custo de compra de alguns carros elétricos equivalente aos preços de carros com motores a gasolina ou diesel.

Trump também rescindiu uma ordem executiva de Biden que estabelecia que 50% dos novos veículos vendidos em 2030 fossem totalmente elétricos, híbridos plug-in ou que funcionam com células de combustível de hidrogênio.

E Trump disse que seu governo buscaria revogar a autoridade da Califórnia para estabelecer padrões de qualidade do ar que são mais rigorosos do que as regras federais. Isso teria um efeito amplo. A Califórnia está visando que 100% das vendas de carros novos sejam elétricos até 2035, e alguns de seus padrões são copiados por pelo menos 17 outros estados.

“O impacto disso será significativo”, disse Shay Natarajan, sócia da Mobility Impact Partners, uma empresa de private equity que investe em transporte sustentável.

Ela afirma que se a demanda por carros elétricos diminuir, como aconteceu em outros países, como a Alemanha, que cortaram incentivos, os fabricantes de automóveis poderiam ficar com fábricas de veículos elétricos e baterias caras e subutilizadas.

“O financiamento federal para fabricação de veículos elétricos e baterias será mais difícil de acessar, aumentando o risco de capital ocioso para projetos de fabricação já em andamento”, disse Natarajan por email.

Representantes da indústria de combustíveis fósseis celebraram a ação do presidente, enquanto ambientalistas lamentaram o que disseram ser um sério retrocesso nos esforços para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e a poluição do ar urbano causada por carros.

Mas o efeito final pode não ser tão amplo quanto a linguagem contundente nas ordens executivas de Trump sugere.

Fundos para incentivar vendas e fabricação de veículos elétricos foram estabelecidos em legislação que o presidente não pode revogar unilateralmente. Trump também não pode revogar regras que o Departamento do Tesouro e outras agências governamentais estabeleceram para determinar como o dinheiro seria distribuído apenas com uma canetada.

Qualquer tentativa de encurtar o processo trabalhoso de propor novas regulamentações que inclui buscar comentários do público quase certamente levará a desafios judiciais.

O Departamento de Energia concordou em emprestar bilhões a fabricantes de automóveis como a Rivian, que receberá US$ 6 bilhões para uma fábrica perto de Atlanta para produzir utilitários esportivos elétricos. Os acordos de empréstimo, alguns finalizados nos últimos dias do governo Biden, são contratos vinculativos.

Grande parte do dinheiro fluiu para distritos eleitorais em estados como Geórgia, Ohio, Carolina do Sul e Tennessee, onde os republicanos dominam a política local.

Seus deputados podem hesitar em revogar leis que levaram empregos e investimentos para seus distritos. Isso é um desafio para os líderes republicanos que lutam com maiorias estreitas na Câmara e no Senado.

Em última análise, indivíduos e famílias decidirão quais carros comprar. Veículos elétricos e híbridos plug-in estão ganhando participação de mercado não apenas por causa dos subsídios, mas também porque oferecem aceleração rápida e custos de combustível mais baixos.

Carros que funcionam com combustíveis fósseis têm perdido participação, embora isso possa mudar se os incentivos financeiros forem removidos de carros e caminhões movidos a bateria.

A mudança abrupta na direção política apresenta um dilema para os fabricantes de automóveis. Alguns podem acolher promessas do presidente de rescindir padrões de emissões e qualidade do ar que forçam os fabricantes a vender mais carros elétricos do que gostariam.

Mas a eliminação de subsídios federais poderia perturbar seu planejamento financeiro quando a maioria está lutando para ganhar ou aumentar lucros.

A reviravolta nas políticas de veículos elétricos aumenta um clima de incerteza e perigo intensificado pela promessa do presidente de impor tarifas de 25% sobre produtos do Canadá e do México, que são grandes fornecedores de carros e peças para os Estados Unidos.

A indústria automotiva dos EUA “será devastada por tarifas sobre veículos montados ou peças nesse nível”, disse Carl Weinberg, economista-chefe da High Frequency Economics, em uma nota aos clientes divulgada nesta terça-feira (21).

Não há sinal de que Elon Musk —CEO da Tesla e chefe do que Trump está chamando de Departamento de Eficiência Governamental— esteja usando sua influência para amenizar o ataque aos veículos elétricos.

A Tesla representa ligeiramente menos da metade dos carros elétricos vendidos nos Estados Unidos, e quase todos os seus veículos se qualificam para créditos fiscais de US$ 7.500.

Quatro dos 16 carros e caminhões que podem ser comprados com a ajuda desse benefício fiscal são fabricados pela Tesla. A GM é a única montadora que tem mais modelos elegíveis, com cinco. Nenhuma outra empresa tem mais de dois veículos qualificáveis.

Musk já disse anteriormente que o governo deveria eliminar todos os subsídios e que a Tesla sofreria menos do que outras montadoras. Mas analistas observam que as vendas e os lucros da Tesla seriam fortemente afetados se Trump conseguisse revogar ou reduzir o crédito fiscal para veículos elétricos, a isenção de ar limpo da Califórnia e outras políticas semelhantes.

A Tesla não respondeu a um pedido de comentário.

(The New York Times)

Autor/Veículo: Folha de São Paulo*
*Extraído do site: Fecombustíveis