18/02/2021 – A grande disparidade entre os valores cobrados por cada estado no ICMS sobre os combustíveis é um obstáculo à aprovação do projeto de lei sobre o tema entregue na semana passada ao Congresso pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
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Levantamento feito pela Fecombustíveis (Federação Nacional do Comércio Varejista de Combustíveis e Lubrificantes) mostra que a diferença do valor cobrado sobre a gasolina chegava a 74% na segunda quinzena de janeiro.
No estado que cobra menos, o Amapá, o ICMS sobre a gasolina correspondia a R$ 0,968 por litro. No Rio de Janeiro, que tem a alíquota mais alta do país, era de R$ 1,687 por litro. Em São Paulo, segundo mais barato, eram R$ 1,062.
Os valores consideram a alíquota cobrada e o preço de referência definido por cada estado, que é alterado a cada 15 dias. Em São Paulo, por exemplo, o governo cobra 25% sobre um preço de referência de R$ 4,235 por litro. No Rio, são 34% sobre R$ 4,929.
No projeto enviado ao Congresso, o governo quer que o imposto passe a ser cobrado em um valor fixo em reais, ao invés de um percentual sobre o preço final, e que esse valor seja uniforme em todo o país. Como justificativa, diz que o modelo garantiria maior previsibilidade aos preços.
A uniformização dos valores, porém, implicaria em perda de receita para estados que têm alíquotas mais altas ou em aumento de preços naqueles que cobram menos, caso resulte em um nivelamento por alto. Ou, em uma terceira hipótese, nas duas coisas, caso se procure uma média nacional.
A proposta é defendida pelo setor de combustíveis, que vê potencial para reduzir as fraudes na venda interestadual de combustíveis: quando, por exemplo, um fraudador compra o produto para venda em São Paulo mas desvia para o Rio, vendendo a carga com um preço menor.
Mas é vista como inconstitucional para tributaristas, já que interfere na competência dos estados para definir suas políticas fiscais. “Se for aprovado pelo Congresso, isso deve ser levado pelos estados ao STF [Supremo Tribunal Federal]”, diz o advogado e professor do Ibet (Instituto Brasileiro de Estudos Tributários) André Félix.
Ele ressalta que não está entre as atribuições do Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária) a definição de alíquotas de impostos, como prevê o projeto de lei do governo. E acrescenta que eventual redução do valor em determinados estados tende a provocar alta de preços de outros produtos.
“Toda vez que dá redução de carga fiscal para um setor, os outros setores da economia tendem a ser tributados a mais”, diz. “O estado não vai perder arrecadação, então não existe segredo nisso: se você beneficia um setor, prejudica os outros.”
Lideranças do setor de combustíveis ponderam que o projeto prevê uma câmara de compensação para amenizar os desequilíbrios. “Os estados que aumentarem o valor do imposto arrecadariam mais e fariam um crédito para compensar os que perderem arrecadação”, diz o presidente da Fecombustíveis, Paulo Miranda.
No Congresso, a tendência é que a aprovação da unificação dos valores é difícil e o foco do debate, caso o projeto venha a tramitar, focará na mudança do percentual para um valor fixo e na cobrança apenas nas refinarias, outra das mudanças previstas no projeto.
“A monofasia [cobrança em apenas uma fase] reduz sonegação, isso é verdade. Se tiver cobrança efetiva na refinaria ou importação, diminui muito o risco de sonegação”, diz o deputado federal Christino Áureo (Progressistas), que preside a Frente Parlamentar para o Desenvolvimento do Petróleo e Energias Renováveis.
Ele entende, porém, que a definição dos valores cobrados deve se de cada estado. “Se houver grande pressão por alíquota mais próxima, estados que estão em situação fiscal mais frágil vão ter muita dificuldade. No Rio, que está em recuperação fiscal, qualquer perda de receita é um desastre.”
Ainda há dúvidas sobre a possibilidade de que o projeto venha a tramitar, já que os impostos sobre os combustíveis também são discutidos no âmbito da reforma tributária. A avaliação é que Bolsonaro tenta agilizar o debate para dividir com os estados a responsabilidade pela alta recente nos preços.